Após alguma ponderação, o pai de Evan, o senhor Douglas, decidiu mudar de vida. Há muito que estava cansado da agitação e do stress característicos da cidade onde vivia e trabalhava. A correria diária para o local de trabalho, o ruído ensurdecedor dos automóveis e, sobretudo, a falta de tempo foram determinantes na sua decisão final. Em conjunto com Evan, partiram numa autocaravana à aventura até à terra da tribo de índios Dwamish, algures para os lados da América do Norte. Pelas suas características paradisíacas, elegeram aquele território para assentar arraiais.
O pai de Evan logo tratou de se dirigir ao Chefe da tribo Dwamish, Seattle, propondo-lhe um negócio mutuamente vantajoso. A troco de uma boa maquia de dinheiro, o senhor Douglas pretendia comprar ao chefe Seattle uma grande extensão de território índio.
Revoltado, o chefe Seattle prontamente retorquiu:
– Como se pode comprar ou vender o Firmamento ou ainda o calor da Terra? Tal ideia ainda é um mistério para nós. Se não somos donos da frescura do ar nem do fulgor das águas, como podereis vós comprá-los? Cada reluzente floresta de pinheiros, cada grão de areia nas praias, cada gota de orvalho nos escuros bosques, cada outeiro e até o zumbido de cada inseto é sagrado para a memória e para o passado do meu povo. Somos parte da Terra e do mesmo modo ela é parte de nós próprios. As flores perfumadas são nossas irmãs, o veado, o cavalo, a grande águia são nossos irmãos; as rochas escarpadas, os húmidos prados, o calor do corpo do cavalo e do homem, todos fazem parte da mesma família. Por todas estas razões, quando o senhor Douglas nos faz chegar a mensagem de que quer comprar as nossas terras, está a pedir-nos demasiado. Não podemos tratar a Terra, nossa mãe, e o Firmamento, seu irmão – Prosseguiu o chefe índio – como objetos que se compram, se exploram e se vendem da mesma forma que se vendem tablets ou telemóveis. O seu apetite devorará a Terra deixando atrás de si apenas o deserto.
Atentamente, o pai de Evan ouviu o discurso do chefe Índio e replicou:
– O chefe Seattle tem razão. Nunca tinha pensado nisso. A Terra não é um objeto como outro qualquer, que se possa comprar ou vender. Ela é a nossa mãe e, como mãe, tem qualquer coisa de sagrado, é intocável.
Posto isto, Evan e Douglas despediram-se amigavelmente do Chefe Seattle e da tribo e continuaram a sua viagem errante.
Texto adaptado do discurso proferido por Seattle (1864) ao governador de Washington, sobre o valor da Terra.
In.: SILVA, Carlos, Como o Ciclo da Lua: 28 Contos Filosóficos e Dilemas Éticos, Chiado Editora, 2015